Após a Segunda Grande Guerra Mundial, muitos veículos utilizados pelas forças militares foram redirecionados para usos civis. Veículos robustos e versáteis, que antes desempenhavam funções bélicas, passaram a ser utilizados em fazendas, campos de lavoura e até para lazer. Nos Estados Unidos e na Europa, o icônico Jeep americano e o Land Rover inglês dominavam o cenário. Na Alemanha, outro utilitário ganhou relevância: o DKW Munga, produzido pela Auto Union, um precursor que deixou seu legado.
O nascimento do DKW Munga
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Em 1954, a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte) lançou uma concorrência para o desenvolvimento de veículos militares leves, robustos e compactos. Entre os concorrentes estavam a Borgward, a Porsche e a DKW, que acabou vencendo e iniciando o desenvolvimento do modelo DKW F91/4, conhecido como DKW Geländewagen (veículo fora de estrada).
Em 1962, o modelo passou a ser chamado de Munga, acrônimo para “Mehrzweck-Universal-Geländewagen mit Allradantrieb”, que significa “veículo universal multifuncional com tração integral”. Ele se tornou uma ferramenta essencial para uso militar, policial e civil, graças à sua versatilidade e resistência.
Características e versões do Munga
O DKW Munga foi produzido em três versões principais: Munga 4, Munga 6 e Munga 8, com capacidade para quatro, seis e oito passageiros, respectivamente. Cada versão apresentava adaptações específicas, mas todas compartilhavam a essência robusta e funcional do modelo.
Munga 4
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A versão básica, o Munga 4, podia transportar quatro adultos ou acomodar motorista, passageiro e uma quantidade significativa de carga ao remover os assentos traseiros. O modelo media 3,44 metros de comprimento, pesava 1.085 kg e tinha uma capacidade de carga de até 690 kg. Curiosamente, as portas eram opcionais, e, caso não fossem instaladas, uma corrente conectava as extremidades abertas para proteção dos passageiros.
Munga 6
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Na versão intermediária, o Munga 6, havia assentos traseiros dispostos perpendicularmente aos dianteiros. O pneu sobressalente ficava na lateral direita, liberando a pequena porta traseira para acesso. O comprimento permanecia o mesmo, mas o peso total aumentava ligeiramente, mantendo-se em torno de 1.100 kg.
Munga 8
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A versão maior, o Munga 8, comportava até oito passageiros. Com 3,6 metros de comprimento e peso de 1.120 kg, essa configuração era mais espaçosa, embora os ocupantes traseiros viajassem com os ombros praticamente colados. A capacidade de carga era ajustada para atender às necessidades do transporte coletivo.
Mecânica e desempenho
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O DKW Munga era equipado com um motor dianteiro de três cilindros em linha, com 980 cm³ de cilindrada, funcionando no clássico sistema dois tempos da DKW. Esse motor entregava 44 cavalos de potência a 4.250 rpm e um torque máximo de 8 kgfm a 3.000 rpm. Para funcionar, exigia a mistura de gasolina com óleo específico na proporção de 1:25.
O consumo médio era de aproximadamente 9 km/l, e a velocidade máxima atingia 98 km/h. A tração era integral nas quatro rodas, com dois diferenciais, e o câmbio manual de quatro marchas, sendo a primeira marcha não sincronizada. A robustez do chassi, construído com longarinas paralelas e barras transversais, garantiu a resistência necessária para enfrentar os terrenos mais desafiadores.
Suspensão e ângulos off-road
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A suspensão independente nas quatro rodas, equipada com amortecedores hidráulicos, proporcionava excelente desempenho em terrenos acidentados. O ângulo de entrada de 43 graus e o ângulo de saída de 41 graus (31 graus no Munga 8) garantiam excelente capacidade de superar obstáculos. Não era à toa que o Munga era extremamente confiável em terrenos como neve, lama e montanhas.
Concorrentes internacionais
Durante a década de 1960, o DKW Munga competia diretamente com outros veículos robustos da época, como o Land Rover inglês, o Jeep CJ-5 americano, o Nissan Patrol japonês, o Toyota Land Cruiser (similar ao Bandeirante no Brasil), o Fiat Campagnola italiano e até o UAZ 469 russo. Cada um tinha características únicas, mas o Munga se destacava pela versatilidade e pelo legado da engenharia alemã.
Contribuição para o Audi Quattro
Curiosamente, a tecnologia de tração integral do Munga foi fundamental para o desenvolvimento do lendário Audi Quattro, um dos maiores vencedores de ralis na história. Os engenheiros da Audi estudaram o sistema do Munga e o adaptaram para os carros de corrida, consolidando a fama da tração quattro.
Produção e legado
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Entre 1956 e 1968, foram produzidos cerca de 75.000 unidades do DKW Munga. Sua importância foi reconhecida décadas depois, como em 2005, quando um modelo Munga 4 foi exibido no Audi Forum Paris, celebrando os 25 anos da tração quattro. Mesmo após o fim da produção, o Munga continua sendo um ícone entre os entusiastas de veículos históricos.
O DKW Candango no Brasil
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No Brasil, o DKW Munga chegou em 1958, sendo rebatizado como DKW Candango em homenagem aos trabalhadores que construíram Brasília. Com aparência semelhante ao Jeep Willys, o Candango foi bem recebido, mas nunca alcançou uma produção em massa.
Características do modelo nacional
O Candango foi fabricado pela Vemag, que adicionou algumas características exclusivas, como a capota de aço. Inicialmente, o modelo tinha tração 4×4 permanente, com a opção de marcha reduzida engatada em movimento. Em 1960, passou a oferecer versões com tração 4×2 para maior conforto em áreas urbanas. Seu motor dois tempos era facilmente reconhecido pelo som característico, que se tornou uma marca registrada.
Apesar de ser robusto, o Candango teve sua produção encerrada em 1963, com apenas 4.400 unidades fabricadas. Isso ocorreu, em parte, pela falta de interesse do exército brasileiro, que optou por outros modelos. No entanto, o Candango conquistou admiradores civis e hoje é uma raridade apreciada em encontros de carros antigos.
Valor histórico e cultural
O DKW Candango tem um lugar especial na história automotiva brasileira. Ele simboliza a transição de um veículo militar para um utilitário civil, adaptando-se às necessidades de uma sociedade em transformação. Encontros de colecionadores, como os realizados em Caxambu e Poços de Caldas (MG), mantêm viva a memória desse pequeno gigante.
Conclusão
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Em 2025, o DKW Munga/Candango permanece como um símbolo de versatilidade, resistência e inovação. Se você é um entusiasta de veículos históricos, valorize a rica história desse modelo que começou como um utilitário militar e encontrou seu espaço na vida civil. No Brasil, o Candango ainda é uma peça rara e valorizada por colecionadores, com preços que podem ultrapassar os R$ 150 mil, dependendo do estado de conservação.
Com seu legado tecnológico influenciando até mesmo ícones como o Audi Quattro, o Munga/Candango continua sendo uma prova de que a engenharia pode transcender eras, adaptando-se às necessidades da guerra e da paz. Portanto, se você tiver a oportunidade de conhecer um desses modelos de perto, aproveite para explorar as raízes de uma história que combina inovação, funcionalidade e resistência.